terça-feira, 14 de abril de 2009

Meteoritos que caíram na África vieram de "asteróide pai"

Fragmentos de possível asteróide criaram rastros brilhantes no céu do Sudão na madrugada de 7 de outubro de 2008
Fragmentos de possível asteróide criaram rastros brilhantes no céu do Sudão na madrugada de 7 de outubro de 2008


Os astrônomos conseguiram pela primeira vez rastrear meteoritos que se originam de um asteróide desde antes que este viesse a se espatifar contra a atmosfera da Terra - e as rochas espaciais em questão estão entre as mais raras que se conhece.

Os telescópios automatizados da Catalina Sky Survey, uma estação de observação astronômica localizada no Arizona, fizeram a primeira localização do asteróide 2008 TC3, um objeto celeste de dimensões semelhantes às de um caminhão, que estava se projetando na direção da Terra no começo de outubro de 2008.

Depois, astrônomos de todo o mundo orientaram seus telescópios de maneira a acompanhar a trajetória do asteróide, e seguiram seu percurso por cerca de 20 horas, até que ele desaparecesse sob a sombra do nosso planeta pouco antes do impacto. A previsão era de que o asteróide se precipitasse na direção da atmosfera nos céus por sobre o Sudão, e que o impacto o dissolvesse em uma nuvem de poeira a cerca de 37km de altitude sobre a Terra. Mas o astrônomo Peter Jenniskens, cuja especialidade é acompanhar meteoros, decidiu que tentaria determinar com exatidão o que aconteceria com o asteróide depois do impacto.

"Jamais foram recolhidos meteoritos de um objeto que se desintegrasse a uma altitude tão elevada na atmosfera", disse Jennisken, que trabalha no Instituto Seti, cuja missão é a busca de inteligências extraterrenas. "Não sabíamos se seria ou não possível encontrar alguma coisa", ele afirma.

Decidindo arriscar em uma idéia não muito provável, Jenniskens e o astrônomo Muawia Shaddad, da Universidade de Khartoum, no Sudão, conduziram alguns de seus alunos em uma busca pelos meteoritos resultantes. O grupo teve sorte, e localizou dezenas de rochas negras do tamanho de punhos ou ainda menores, feitas de um "material tão frágil que anteriormente não constava de qualquer das coleções de meteoritos existentes", disse Jenniskens.

A descoberta incomum vem de um tipo raro de asteróide e pode oferecer novas pistas sobre a origem do sistema solar. "Pela primeira vez, dispomos da cadeia completa de provas", disse Michael Zolensky, mineralogista cósmico do Centro Espacial Johnson, da Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço (Nasa), em Houston, em entrevista. "Esses meteoritos serão essenciais para uma compreensão muito mais ampla dos asteróides".

Interrupção cósmica
Tal como previsto, o 2008 TC3 iluminou os céus por sobre o norte do Sudão às 5h45min de 6 de outubro, pouco antes do início do horário matutino de oração dos muçulmanos. Diversos relatórios de observação foram enviados por pessoas que estavam posicionadas ao longo do rio Nilo, no norte do Sudão. Um desses homens informou a Jenniskens que suas orações havia sido interrompidas. "Toda a paisagem se iluminou", conta Jenniskens que o homem disse, "e ele correu para fora e viu uma grande nuvem". Outro observador, por medo de um ataque com foguetes, se lançou ao solo quando viu a nuvem.

O clarão luminoso inicial bastou para despertar um bilheteiro em uma estação ferroviária, e ele estava acordado quando surgiu um segundo clarão, de menor intensidade. Poucos minutos mais tarde, ele ouviu o ruído surdo de uma chuva de meteoritos atingindo as areias do deserto perto de onde estava.

Vasculhando o deserto
Em dezembro, Jenniskens, Shaddad e diversos de seus alunos vasculharam a remota área deserta perto da estação de trem. No total, sua série de buscas localizou 280 meteoritos que inicialmente eram parte do asteróide 2008 TC3. Os primeiros 47 meteoritos localizados, detalharam os astrônomos em artigo publicado pela revista Nature, representam apenas cerca de 4kg de material do asteróide original, cuja massa total foi estimada em cerca de 80t. As rochas espaciais foram encontradas espalhadas por uma área de 29km, o que indica que os fragmentos que sobreviveram do asteróide foram ejetados em alta velocidade quando da explosão.

Achados raros
Os meteoritos são "negros, escamados, escuros e têm aparência porosa", disse Jenniskens. As análises demonstram que estão revestidos de um material chamado olivina e que contêm diamantes microscópicos, o que sugere que sejam meteoritos de ureilite de um asteróide de classe F, um tipo que responde por cerca de 13% dos asteróides conhecidos.

A maioria dos asteróides existe até hoje mais ou menos como quando inicialmente formados, 4,6 bilhões de anos atrás. Ainda contam com muitos de seus componentes originais - grãos finos, partículas de poeira cósmica e pequenas gotículas derretidas. Outros tipos de asteróides "cresceram tanto, e foram tão abalados por colisões, que derreteram", diz Jenniskens. "O ferro afunda para o núcleo e os demais materiais flutuam para o topo".

Os asteróides da classe F são corpos celestes intermediários, parcialmente derretidos mas com outras áreas que revelam os materiais que os compõem. "Nossa rocha ainda continha larga proporção do carbono inicial, ali, ainda que cozinhada a temperaturas elevadas", diz Jenniskens.

Além disso, as cores dos asteróides também mudam com base na distância que eles mantêm do sol; os asteróides do cinturão interno tendem a ser mais brilhantes e contam com assinaturas de espectro que sugerem uma composição mineral que os difere daqueles que se localizam no limite externo do cinturão de asteróides.

No cenário mais simples, os asteróides mais escuros são interpretados como mais primitivos, aponta Lucy McFadden, da Universidade de Maryland em College Park. No entanto, a ureilite mais ou menos contradiz essa tendência, porque sabemos que foi aquecida e ainda assim é escura. McFadden acrescenta que os asteróides parecem representar fragmentos de um quase planeta que devia ter centenas de quilômetros de diâmetro antes de se desintegrar.

Economizando milhões
Porque o asteróide foi observado em sua aproximação, houve tempo mais que suficiente para que os astrônomos determinassem sua órbita. Descobriram que ele estava percorrendo órbita semelhante à de um outro asteróide classe F, muito mais amplo, o 1982 KU2, que talvez seja o antecessor original do 2008 TC3.

"Os astrônomos conseguiram, pela primeira vez, ligar inequivocamente os pontos que conectam as amostras de meteorito recolhidas e o asteróide", disse Harry McSween, geólogo e especialista em meteoritos da Universidade de Knoxville, no Tennessee. As informações assim obtidas, acrescentou, equivalem a "uma missão gratuita de pesquisa em asteróide, que teria custado muitos milhões de dólares à Nasa".

Tradução: Paulo Migliacci

National Geographic

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